JOSÉ NÊUMANNE PINTO
Jornalista, editorialista do Jornal da Tarde, comentarista da Rádio Jovem Pan e do SBT, poeta e escritor com diversos livros publicados, entre eles: Solos do silêncio – poesia reunida e O silêncio do delator, agraciado com o Prêmio "Senador José Ermírio de Moraes", da ABL. E conheça o também a poesia do colunista no site: http://neumanne.com
Coluna de 23/10/2014
A SUSTENTÁVEL LEVEZA DE MARIA DAS GRAÇAS TARGINO (*)
Maria das Graças Targino é uma respeitável professora de Comunicação e os textos que compõem esta coletânea se sustentam sobre pilares do templo de sólida carreira acadêmica. Os campos de interesse devassados por seus olhos e analisados por seu cérebro são de uma variedade incrível: paisagens de viagens; tipos humanos cuja experiência de vida lhe chamou atenção; comentários nas redes sociais do computador; a própria vocação pela docência; e a cobrança da decência, entre outros. Mais do que a base do conhecimento, que aqui merece ser chamado de erudição, contudo, o fio condutor desta narrativa, que não é fictícia, mas documental, é tecido com elegância e leveza que denotam a delicadeza e a familiaridade com que a autora aborda o exercício da escrita. As imagens que ela reproduz com precisão e cores de retratista (e não é à toa que o fotógrafo Sebastião Salgado é um de seus ícones) e os conceitos que ela desfia ao longo do novelo são conduzidos de tal forma no navegar pelos mares de sua palavra que o leitor se enfronha (e aqui a palavra ganha força, porque definitivamente a leitura leva a uma intimidade de lençóis, fronhas e edredom sem contato físico, mas de uma conversa a meio tom e ao pé do fogo) e participa da condução do argumento como se fosse seu cúmplice. Temas batidos como a prostituição, controversos como a relação mãe-filho(a) ou duros de suportar como o envelhecimento físico ganham novos tons a partir de pinceladas únicas ou reiteradas. Este livro é um caleidoscópio de imagens, cores, pensamentos e emoções, mas também tem uma unidade singular, mal disfarçando a construção sólida, embora leve, de um perfil variegado, embora também de impressionante nitidez. Infelizmente para um fanático de futebol, como este seu leitor impenitente, Graça não se dignou olhar a bola branca rolar sobre o gramado verde. Se o fizesse, talvez lhe fosse dado perceber que, naquele jogo de tensões e relaxamentos, houve um craque cujo estilo se assemelha ao da escrita dela. E este foi um jogador que João Cabral de Melo Neto escalou como tema: Ademir da Guia, o Divino. Como o jeito do meia da Academia do futebol no Palmeiras, a escrita de Graça padece de uma falsa lerdeza: sem correr, sem perder o fôlego, ela chega sempre à palavra exata e atrás dela chegam outras que a completam. Se alguma vez, o poeta pernambucano, em cuja Recife a autora viveu sua adolescência, a tivesse lido, teria se lembrado do ritmo de suas frases ao descrever o jogo do ídolo improvável: “Ritmo morno, de andar na areia, / de água doente de alagados, / entorpecendo e então atando // o mais irrequieto adversário”. Ritmo ditado, escreveria Graça Targino, pelo destino da finitude do tempo infinito: “Se houvera tempo, talvez não carregássemos conosco o peso dos mortos”. Amém.
(*) Texto de contracpa do livro "Ideias em retalhos: sem rodeios nem atalhos", Editora Halley, de Teresina/PI, de autoria do colunista
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