Coluna de Rogel Samuel
Rogel Samuel é Doutor em
Letras e Professor aposentado da Pós-Graduação da UFRJ. poeta, romancista,
cronista, webjornalista.
Site pessoal:
http://literaturarogelsamuel.blogspot.com/
Nº 153 - 1ª quinzena de maio 2009
(atualização quinzenal, dias 10 e 25)
O IGARAPÉ DO INFERNO, 11
(Romance inédito)
Mas lentamente os Numas cercaram o Seringal. Como sombras. Fecharam o seringal nos seus próprios limites. Impediram a expansão desmesurada.
O Seringal era imenso. Viajava-se dias, dentro dele. O Seringal teve de estacar, deter-se, refluir, limitado pela invisibilidade. Encontrou seu termo invisível.
Os Numas eram como se não existissem. Senão pelo vazio de sua ausência. Inumeráveis, recobertos, no nenhum lugar, no não-traçado.
Freqüentemente, estavam nas árvores e pássaros do céu.
Mas não eram aparência, mas imanência.
Herméticos, multiplicados, fortes.
Sem guerrilha, possíveis mas improváveis, mitificados, solidários, violentos, irreconciliáveis.
Prontos ao ataque. Que nunca se dava.
Fadados a matar.
Apavoravam.
Eles eram pontos estratégicos, desconhecidos, na correlação de poder daquela natureza, de que eram guardiões.
Distribuíam-se, de modo incompreensível, irregular, em focos de força. E viviam em qualquer lugar, pois eram capazes de sobreviver até debaixo da água, em bolsas de ar.
À noite eles se disseminavam. Preparavam armadilhas nos caminhos, pequenas cobras venenosas.
Mas eram seres frios, enevoados. Deuses que desciam para nos justiçar de noturnas culpas, olhos espalhados por toda a parte, observando.
Às vezes deixavam-se entrever.
Muitos seringueiros tentaram caçá-los a tiros, e por isso logo após eram mortos numa vingança fria e precisa. Eles tudo sabiam, se deslocavam rápidos. Como um sopro. Rompiam além, na nossa frente. Ou só som, se reagrupavam nos caminhos, deixando propositais pegadas, recortavam o ar com sibilantes flechas de vento, cruzavam redes de relação dentro do Seringal, infiltrados, atravessando.
Algumas vezes chegaram ao jardim do Palácio, para afrontar.
São homens? São fantasmas? Encantavam-se na floresta de ouro puro.
Em sinais diziam: "estive aqui".
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