Coluna de Rogel Samuel 
Rogel Samuel é Doutor em Letras e Professor aposentado da Pós-Graduação da UFRJ. poeta, romancista, cronista, webjornalista.
Blog pessoal: http://literaturarogelsamuel.blogspot.com/

Nº 289 - 2ª quinzena de novembro de 2015
(atualização quinzenal, dias 10 e 25)

A PANTERA

31.

Mas, do mesmo modo súbito que Helene tinha surgido na minha vida, assim ela se foi...

Um dia, me chega a notícia de que Jara tinha sido vista em Manaus...

Fiquei muito tempo assim... Alguém dizia que era ela, outro dizia que não. Havia várias notícias vagas.

Mas se ela quisesse saber de mim, ela saberia a quem se dirigir.

Não. Eu não queria mais vê-la. Estava curado dela.

Continuei tocando a minha vida e meu curso na Escola. Eu tinha inaugurado a moda indígena. Fazia agora uma série de enfeites indígenas, colares para senhoras. Eram projetos de joias. Inaugurei, na Europa, a moda indígena.

E não entrei em desespero por notícias de Jara. Estava cansado daquilo.

Mandei recado para os amigos:

– Se Jara estiver aí e quiser falar comigo, me avisem.

E era só.

Eu tinha de tocar a minha vida solitária. Do ponto de vista profissional, tudo ia bem. Tinha permissão do governo francês para trabalhar, e pagava os impostos. O mundo seguia o seu rumo... Por quê tinha de ficar desesperado?

Comecei a procurar companhia, amizades, apoio. Passei a frequentar lugares onde as pessoas iam encontrar e fazer novas relações. Mas não queria mais ninguém.

O efeito imediato das notícias de que Jara tinha sido vista em Manaus foi que passei a sonhar com ela.

Não eram sonhos claros, inteligíveis, mas pedaços de sonhos desconexos, mas eram bons, que me davam felicidade.

Jara aparecia como uma jovem que me ajudava, e principalmente em uma espécie de viagem.

Primeiramente, ela surgia em relação a uma certa viagem de trem que eu tentava fazer. Depois, veio junto a um sonho em que eu preparava duas malas para viajar, e já estava atrasado, e podia perder o vôo...

Jara nos meus sonhos era um vulto difuso, indefinido, mas eu sentia que era ela.

Que viagem seria aquela? Que partida?

Talvez fosse a morte, talvez prenunciasse a minha morte...

Mas Jara, nos sonhos, era a protetora.

E eu tentava não pensar nela, tentava esquecê-la.

Enquanto isso, não sentia solidão. Nem tristeza.

 

Entretanto, vieram notícias de que Jara agora estava casada com outro homem, o dono de um barco, e que vivia com ele a bordo.

Aquilo a princípio me afetou. Senti ciúme. Como ela podia ter-se unido a outro? Depois me enchi de apreensões. Como ela podia expor-se assim, depois de ter vivido comigo tantos anos?

Eu comecei a temer por sua vida, pois ela podia ser presa e, uma vez presa, torturada até à morte para “delatar” os outros membros de nossa organização.

Ela nada sabia, eu nada lhe tinha dito. A única coisa que ela sabia era onde estava o cemitério do exército inimigo no meio da floresta.

Eu tinha de fazer alguma coisa para protegê-la. Afinal eu era responsável por tudo, por colocar sua vida em risco.

Assim, mandei mensagens para membros de nossa organização, e pedi para tirá-la daquela situação.

À princípio meus companheiros responderam com o indicativo de raptá-la à bordo.

Eu disse para não fazer aquilo. Jara era esperta e podia defender-se. Ela era rápida e perigosa, sabia contra-atacar de modo fulminante.

Temi por sua vida novamente.

Meus companheiros tinham de preveni-la, apenas.

Então, encarregaram a nossa companheira Geralda de entrar em contato com ela.

Geralda viajou no barco onde Jara morava com seu novo namorado e no meio da viagem aproximou-se dela em segredo e alertou-a do perigo.

Jara respondeu que precisava falar comigo.

De fato, no meio da noite desapareceu.

Procuram-na muito. Disseram que ela tinha caído na água.

Mas eu sabia que ela tinha pulado para fora do barco, tinha sumido no meio da floresta.

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