COLUNA DE THATY  MARCONDES 
Na área empresarial, trabalhou na implantação de projetos de administração, captação e aplicação de recursos, e ainda em redação e revisão de textos técnicos. Nascida em Jundiaí, reside atualmente em Ponta Grossa/PR, onde exerce o cargo de Conselheira Municipal da Cultura.

2ª quinzena de novembro - Coluna 55
(Próxima coluna: 3/12)

Estranhos lençóis

As pessoas mudam. Com certeza: o ser humano (normal, pensante) está sempre às voltas com o seu próprio crescimento interior, com sua conscientização. No mundo moderno, global aldeia, as informações (bem como as deformações das notícias) voam quase que à velocidade da luz. Quantas notícias em tempo real! Chegamos a ouvir os estrondos da guerra ao mesmo tempo em que o repórter que se encontra no local nos enviando a notícia. É espantoso. Mas também é espantosa a forma como nos distanciamos do que está ao nosso lado: a notícia na esquina, a batida de carro na avenida mais próxima, o drama do vizinho, a fome da mulher que passa em casa 3 vezes por semana à procura do “ reçaiqui ”, como ela diz (lixo reciclável plástico e papel), o roubo do carro do professor substituto assalariado (e mal pago, diga-se de passagem), à porta da universidade, o progresso dos nossos filhos, a mudança de opinião dos amigos. Talvez a única coisa imutável seja a rotina viciada e repetitiva dos nossos pais: a mesma novela (começo, meio e fim: tudo igual), o mesmo “ plim-plim” em todos os intervalos, os mesmos escândalos noticiados nos intervalos (falta de imaginação dos trapalhões políticos) embora com nomes diferentes. Enfim: algumas coisas mudam, outras são permanentemente fixas.

Por estes dias ando avaliando as mutações à minha volta: meu filho mudou, eu mudei, meu marido mudou. Não mais nos conhecemos. Mal nos reconhecemos. Meu filho virou homem, e tenho saudades do meu menino; meu companheiro virou marido e eu tenho saudades do meu cúmplice; eu virei dona de casa com jornada dupla, recomeçando do zero nova empreitada, e tenho saudades de quando eu sonhava, apenas, em ter um tempinho pra escrever de forma displicente, sem compromisso, e agora tenho coluna fixa em jornal local. O ponto fixo de referência é minha mãe: ser imutável ao longo dos anos, imaginando que a vida é o drama da novela das oito, que se vive um romance de novela das sete e que teremos, todos, um final feliz como a novela das seis!

Hoje pela manhã senti-me acordando em outro lugar, outra casa, outro travesseiro. Acho que encontrei a razão da noite mal dormida: não reconheço minha casa, nem minha família. Mudaram a roupa de cama e mal reconheci meus novos e estranhos lençóis. Coisas de liquidação, graças ao crédito junto às Casas Pernambucanas.

Levanto, tomo um banho pra reencontrar meu cheiro e mudou a marca do sabonete. Tudo tão estranho! Essa nova-velha realidade, onde nós, seres mutáveis, de repente, numa manhã qualquer, mal nos reconhecemos! Há uma estranha no espelho: a menina cresceu e tenta se conformar com sua nova face. Uma ruga nova aqui, um cabelo branco ali, uns quilos a mais. Quem será esse estranho ainda deitado na minha cama? Corro ao quarto do meu filho e não encontro meu menino dizendo que me ama. Há apenas um homem, um desconhecido, dizendo pra eu “não encher o saco logo cedo e parar com essa bobagem de beijá-lo”, o que faço em meio às lágrimas das saudades de um tempo que não volta, pois não faz parte do enredo da novela da minha mãe que, ainda dormindo, aguarda o primeiro “ plim-plim ” do dia.

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