"DIVERSOS CAMINHOS EM BLOCOS", POR ZANOTO
Jornalista famoso do Correio do Sul (Varginha/MG), desde 1950 mantém a coluna lítero-poética "Diversos Caminhos" naquele jornal.
Manteve coluna em Blocos Online de janeiro de 1998 a dezembro de 1999, e agora retorna à Internet, novamente através de nosso site.
C. Postal, 107 - 37002-970 Varginha/MG
Coluna de 15/05
1. Hugo Ruyer de Carvalho, de Valença (RJ), me disse certa vez que a vida gostosa, a verdadeira vida do indivíduo, são as férias. No que, imediatamente, meu amigo P. H. Xavier acrescentou que os lazeres também. Por isso, disse Hugo Ruyer, a gente fala: “estou no gozo de minhas férias”. Há mais de duas semanas que Rodolfo Serkin, participante do nosso modesto grupo, se ausentou de férias e não dá sinais de regresso. Minha mala está vazia. Creio que está na hora de enche-la e sair por aí a passeio. Vida nova, meu caro: passeio, férias, conforto, bem-estar, fantasia, lazer. Benza-Deus que nada disso seja, para mim, no momento, uma utopia.
2. “Há muitas maneiras sérias de não dizer nada,
mas só a poesia é verdeira”. (Manoel de Barros). Lembro-me
até agora do olhar do cão, e me arrepio. Um caminhão
velho, naquele dia, passou por cima dele. “Aquele dia se foi sem se ter
ido/ à sólida presença no regaço/ da Mãe
Maria e seus rebentos ávidos// O silêncio acorda-nos e ao
Pai/ tão presente/ tão calado/ sempre em paz” (Tereza Tenório
(Recife/PE). O poema de Tereza Tenório se intitula “O Regaço”
e está na página 49 do livro “A casa que dorme”. Segundo
Marcos Vinícius Vilaça, da Academia Brasileira de Letras,
Tereza Tenório tem o sentido da transcendência.
3. RICARDO PEDROSA ALVES, de Curitiba/PR, este poema:
Um branco
clara: nem crepita: um branco
um lago: aqui
o vapor dê bagos aos olhos
aqui: areialva abissínia
um branco: sem luz
4. Do carnaval deste ano, mais uma vez eu estive os três dias
em Santos, não ficou nada, a não ser o passeio a Santos,
que é gostoso, mas choveu os dias todos, banho de mar foi só
com o mormaço. Não vi um confete em lugar nenhum, nem jogados
no chão. Numa farmácia eu ganhei m boné e os outros
bonés que vi foram de uns jovens que passaram na esquina do Hotel
Atlântico, de automóvel. Com relação à
loucuras, não aconteceram. Rodolfo Serkin me disse outro dia que
pretende passar o próximo carnaval em Zurique. Pra mim, é
uma péssima escolha. Com gritos entrecortados de soluços,
uma mulher negra, bem no meio da rua, próximo ao shopping, pedia:
mais música, mais batuque, me deixem rebolar!
5. Enquanto eu escrevia o tópico anterior, P.H. Xavier dizia
para o Galvão Conde, diretor da Rádio Vanguarda de Varginha,
que o que desapareceu está morto. Eu fiquei cismado que se trata
de uma dedução desta nossa época. Até a beleza,
hoje em dia, perdeu sua qualidade. Quem sabe Stendhal daria uma brilhante
solução para esse conceito, mostrando-nos que a realidade
atual pode atingir o grau da perfeição. É melhor não
fazermos inventário da nossa é poça, neste impreviscível,
misterioso, enigmático e dramático século vinte e
um.
6. SEREIA SORAIA
Soraia é uma sereia
por isso não brincou na areia...
Há pescador que jura
já ter visto Soraia encantar,
chamando, chamando,
em noite escura,
todo mundo pra navegar.
Seria Soraia sereia
ou uma estrela do mar?
(Rosemary Sordi Meyer, professora de Português e Literatura,
formada pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná,
em 1974. Também escreve literatura infantil).
7. Há muitos anos que não caminho entre a multidão. Creio que não me acostumo mais, além de que não mais nenhum prazer nisso. É como se a proximidade doesse. Quando vejo nos jornais foto de multidões caminhando numa avenida ou concentradas numa praça, num movimento de protesto, ou assistindo algum show, me dá arrepios. Para ser franco, isso abala minhas estruturas, dando-me um pouco de medo. Não sei se eu era mais novo, mas achava a multidão naquele tempo mais dócil. Hoje considero a multidão violenta. O fato é que já constatei isso várias vezes: não há multidão boa, seja em que lugar estiver. Não há liberdade no meio da multidão. E há uma verdade que já li em várias reportagens: a multidão não tem rosto.
8. PRIMEIRA ODE A NERUDA
Que alma inventou/ o tesouro do teu nome?
Pássaros vagabundos serviram-te/ banquetes de amizade.
O tempo cobrirá teus ossos/ com flores vestidas de sol.
Por ti, ó mastro incendiado de poesia, /conchas se abrirão
à luz
sombria/ dos cárceres!
— Gabriel Nascente (Goiânia/GO) — “águas da meia ponte”.
9. “Eu não me arrependo de nada, tudo o que fiz foi viver. Não é minha culpa se as sociedades jamais compreendem a beleza da vida” (Paulo Poeta). Nunca mais ouvi falar de Paulo Poeta. Urhacy e Leila devem saber por onde ele anda. Em 1981, ele me mandou seu livro “EI, VOCÊ!...” com esta dedicatória: “O calor humano de uma carioca solto nas ruas do mundo. Que nossos universos se integrem nos cotidianos da vida ampliando os horizontes da humanidade”.
10. Infelizmente, em termos de música e cantores, está difícil debelar o mau gosto existente por aí pelo Brasil. O caminho da programação de muitas rádios está marcado não somente pelo mau gosto, mas igualmente por verdadeiros dinossauros de música e da voz. Meu Deus, por quê, se há tanta gente boa cantando e fazendo música. Sem dúvida, há por aí uma sinfonia da mediocridade. Há quem diga que na poesia também.