Crônica da 1ª quinzena de setembro
Histórias de Homem
Dois corpos em decúbito dorsal, solitários e educadamente quietos. Estendidos sobre mesas de mármore. Branco e negro, na imagem fatal.
O negro sobre mesa de mármore branco. O branco na incerteza da negra pedra. Personagens da vida animal, outrora. Alimentos e fartura sem igual, agora. Uma visão da ausência de possibilidades.
Nus, inertes e pálidos, talvez o fim da vida. Talvez um termo final. Na retina mero trabalho. Nas luvas, preso bisturi levanta todo astral.
Um se levanta ao toque medicinal. Está vivo, afinal! Apenas saturado pelo etílico gosto, não apurado. Bêbado feito porco! Um animal!
O outro atacado por pivetes, na esquina. Que sina! Um tiro apenas! Perfurou o coração. Órgão vital!
No IML, quem não respirar é cortado. Coitado! O abdômen cheio de serragem. Findou-se o homem. Ponto final!
Outro sujeito, também deitado, de lado, no rosto a preocupação de doença fatal. Câncer de próstata mata, é necessário cuidado sem igual.
Há um médico, proctologista, especialista em reto, na retilínea visão um toque que dói a moral do obtuso paciente, ignorante, coisa e tal.
Entre quatro paredes, uma maca, luvas e o exame constata inflamação e o rosto do clínico estampa preocupação.
O paciente, nervoso, reconhece aquele sinal: Há algo errado no corpo, há algo anormal!
Foi-se o riso, nervoso, sem saber o que fazer, vira-se para o médico e diz: — Num tem nem beijinho?
Leva um tapa, na cabeça, sem carinho!
O quarto, volta ao começo, usa fralda feito criança e toma banho em banheira. Dado por enfermeira, sem fantasia sexual, coitado, vive babando feito raivoso animal.
Teve derrame, vive torto, suja-se todo e dá espetáculo de contorcionista em palco vazio, sem platéia ou aplauso. Nem palmas de parentes recebe.
De fralda e mamadeira, lembra neném com coceira. É o fim, deixou herança, nome, placa de rua, foi-se a galhardia, da música nem é mais a melodia.
Com o passar dos anos, virou apenas referência de localidade: Fulano mora naquela cidade, na rua João das Antas.
Quem foi João das Antas? — Sei lá! Uma anta qualquer!
Perdeu-se na memória. Sem nome nem glória!
Moral da história: Bêbado ou doente, o fim da arrogância é acabar em maca de hospital. E o que é pior, em decúbito dorsal! Sem beijinho!