Samuel Penido
Nas últimas décadas, quer como leitor constante de poesia,
quer como eventural comentarista de jornal literário, debruçâ-mo-nos
muitas vezes sobre os livros de Renata Pallottini. nunca, porém,
como agora, tendo à nossa frente uma obra que reúna quase
toda a sua poesia publicada e mais a inédita até a data da
publicação. Isto faz diferença. É que sua poesia
— ressalvado o normal aperfeiçoamento que só os anos trazem
— sempre exibiu um traço comum: a hegemonia do solidário
sobre o individual. Em suma, sempre foi a poéticada
comunhão. Mas o ato poético não é, por
natureza, um ato de comunhão? — indagaria o leitor. Nem sempre.
Há poetas e poetas. Aqueles para quem a poesia é um ato de
comunhão e aqueles que a consideram um jogo de espelhos, presos
que estão ao seu mundo particular (não raro, fantasmagórico),
à chamada "torre de marfim". Renata Pallottini pertence ao primeiro
grupo, ao grupo de poetas cuja obra é um prolongamento do Eu, uma
ponte para o Outro, uma descoberta do Mundo.
Desde cedo o universo circundante tocou-lhe a sensibilidade. Aos poucos
foi sendo atraída por outros temas que não os estritamente
íntimos — a cidade, o povo, a terra natal e a estrangeira, a liberdade,
a fraternidade; aos poucos, enfim, foi mergulhando na grande paisagem cósmica
e humana. E à medida que sua obra se enriquecia tematicamente, também
no campo semântico e imagístico se adensava, assumia uma facies
cada vez mais peculiar.
Hoje, podemos afirmar sem sombra de dúvida: existe uma expressão
poética pallottiniana, inconfundível, detectável à
primeira vista. Expressão que nada tem de improviso ou artifício.
Porquanto fruto de longa e intensa vivência lírica, de toda
uma "luta com a palavra", para citar Drummond.
Vista no conjunto, sua produção lírica é
o eco de um caminhar pelos territórios do cotidiano e da transcendência,
do efêmero e do eterno. Nesse caminhar a autora vai resgatando, armada
de intuição criadora e competência técnica,
as sementes do poético que latejam nos momentos de solidão
e nos atos de comunhão do homem.
Esse o mundo poético de Renata Pallottini. O mundo da palavra
cálida, necessária, urgente. Carregado de humanidade e de
emoção estética. Com esse o mundo o leitor prontamente
se identificará.