GLAUCOMATOPÉIA [#41]

[1] Se a mulher tem sido, no cômputo geral, o mais constante motivo na poesia universal, há casos em que a primeira pessoa do poeta fala mais forte, quando se trata de rememorar a infância. Muitas vezes um animal de estimação (mais comumente o cão) ocupa o lugar do melhor amigo dum menino, antes que este cresça e se apaixone pelo sexo oposto. Tudo isto considerado, pode-se dizer que mulher, menino e cachorro figuram como personagens de muitas aventuras poéticas. No meu caso, o menino se confunde com o cachorro de outros meninos e com a mulher do malandro, papéis que estudei recorrentemente. Um dos sonetos em que capturei o menino em seu convívio com os demais foi este:

SONETO 307 PUNHETEIRO

Se "circle jerk" é roda de punheta,
já fica desde logo demonstrado:
brinquedo de guri não é quadrado.
A mente dum adulto é que é careta.

Pensando nos peitinhos, na buceta,
mas vendo os coleguinhas lado a lado,
libido de menino é complicado:
bedelho mete em tudo, esse xereta!

Pentelho inda não tem, e já maneja
com toda a habilidade seu cacete,
expondo a cabecinha de cereja.

Lembrar do pirulito e do sorvete
é quase que automático. Fraqueja
um deles, e na turma faz boquete.
 

[2] No terreno do glosismo, a experiência de juntar as três figuras no mesmo mote é dose cavalar, feita de encomenda para azucrinar a idéia do poeta. Não é para menos que a reação do potiguar Luiz Xavier tenha sido esta, ao glosar o mote abaixo:
NÃO SEI QUEM DIABO INVENTOU
MULHER, CACHORRO E MENINO!

Menstruação e cocô,
Veado e carachué,
Soldado e bicho de pé,
Não sei quem diabo inventou.
Mas isto só não bastou,
Tem macho falando fino,
Muito cabra cabotino
Colecionando porqueira,
Juntando na prateleira
Mulher, cachorro e menino.

[3] Claro que não me furtei ao desafio de fazer caber numa décima três temas tão instigantes, e me safei da missão com esta glosa bem auto-referente:
Agora que cego estou,
Só mulher tem dó de mim;
Macho zomba! Azar assim
Não sei quem diabo inventou!
Na fossa mais fundo vou
Quando meu lado canino
Assumo e, então, me imagino
Lambendo o pé dum frangote!
De três bichos fiz meu mote:
Mulher, cachorro e menino! [8.76]
GLAUCO MATTOSO
Poeta, letrista, ficcionista e humorista. Seus poemas, livros e canções podem ser visitados nos sítios oficiais:
http://sites.uol.com.br/glaucomattoso
http://sites.uol.com.br/formattoso

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