2ª quinzena de janeiro - Coluna 59
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O HOMEM DO SACO
A língua rançosa se cala no marasmo de sábado. Os restos das velas de sexta ainda queimam na encruzilhada; a farofa levada pelo exú do vento; o perfume barato exala no ar e sobe até o 8º andar, misturando-se à fumaça de peixe frito; a fita vermelha adorna a cinta liga da rainha dragão, que acende um cigarro do maço da entrega; um freguês se transforma em cliente assíduo. Na rua alguém troca um pneu; na loja em frente alguém pede desconto.
O homem do saco tudo vê. A criança no saco nada sente.
— Mãos pra trás, larga o saco, encosta na parede, pernas abertas!
Ele se assusta e derruba o saco. Dentro o ruído de choro. O homem tira as mãos de trás, tapa os ouvidos, grita pedindo clemência pra filha.
O novato atira.
O homem do saco tomba ao lado da boneca. Só ela chora agora por seu pai.