Uma vida, várias histórias
Fabiana de Castilho

6º capítulo

         Nós nos conhecemos em meu primeiro mês nos Estados Unidos, em um night club da região. Ele sempre muito gentil, educado e o único que me tratava de forma decente. Começamos a namorar. Conversávamos bastante. Ele era uma espécie de amigo, confidente e que sempre me dava força para continuar, sem esmorecer. Um dia, cansada de tudo o que estava passando, trabalhando sem salário, sem poder estudar, sem grana para comprara comida e pagar as contas, resolvi aceitar seu convite para morarmos juntos. Hoje sei que tomei esta decisão de cabeça quente e movida pelo calor da situação. No começo "tudo eram flores". Ele sempre fazia de tudo para me ver bem, desde que ele pudesse ter algum proveito de tudo isso. Só que percebi  tarde demais.
  Depois de alguns meses juntos começaram as mudanças e as primeiras imposições e  regras, para este novo jogo. A primeira foi o casamento. Algo que realmente nunca desejei. Nem com ele, nem com ninguém. Não tive muitas escolhas. Estava sem dinheiro e quase tudo o que recebia em meu novo trabalho, como baba, mandava para ajudar minha família, no Brasil, a pagar as contas e quitar o financiamento da casa. Não tinha nem para uma passagem. E a pressão foi aumentando ate o dia em que ele resolveu ser taxativo: — Ou a gente casa ou você vai ter que procurar outro lugar para ficar.
  Parece absurdo, mas eu aceitei. Fique apavorada com a idéia de não ter para onde ir. Não podia voltar para casa, não conhecia ninguém, sem grana e o futuro que ele me oferecia era tentador. Casa, estudo, possibilidade de um trabalho melhor e mais chances de ajudar minha família. Hoje eu entendo bem a expressão "vender a alma para o diabo". Foi o que eu fiz. Vendi minha alma a um diabo bastante sedutor. Ele sabia de minhas necessidades, me ofereceu um mundo que eu nunca tive e eu aceitei. Só que quando "assinei o contrato" esqueci de ler as letrinhas miúdas no fim da página. E ele foi me dando corda, até resolver que era chegada a hora de puxar o nó.
  E foi então que percebi o buraco em que estava caindo. O respeito acabou e deu lugar a uma serie de cobranças e obrigações. Um novo comportamento foi traçado para mim e mais uma vez, tive que deixar de ser eu mesma e representar o papel da mulher perfeita, dona de casa zelosa e amável, a qual ele sempre apresenta com muito orgulho. Em troca eu teria uma boa vida, poderia estudar, pensar em ter um emprego melhor...
  E quando consegui tirar o manto que eu havia colocado em frente a meus olhos foi que descobri que estava doente. E com a pior de todas as doenças. A da alma. A que tira, pouco a pouco, todas as ilusões e sonhos, e que remédios não podem curar. Novamente tive vontade de morrer. Cheguei a colocar um revolver na boca, mas não tive coragem de puxar o gatilho. O medo me dominou mais uma vez.
  Os dias passaram a ser motivo de tortura para mim. A noite um acalento para minha dor. Uma morte aparente que funciona como fuga da situação em que me coloquei e na qual não encontro porta para abrir. Eu sei que ela esta lá. Mas não a vejo. E se encontrá-la não sei como vou abrir, pois perdi todas as chaves.
  O homem com quem vivo, não e nem de longe é quem eu imaginava e sonhava.  Eu sei que o príncipe total não existe e que ele tem mais dias de sapo do que de realeza. Sei também que as história de fada só tem um final feliz porque acabam com casamento e ninguém volta para contar como foi a vida da Branca de Neve ou da Cinderela após a lua de mel ou após dois meses de convivência, debaixo do mesmo teto, com seus parceiros. Ai eu acredito que a frase "e viveram felizes para sempre" mudaria para " e viveram felizes até que resolveram dividir o mesmo banheiro após a terrível idéia de matrimônio".
  Quanto ao amor? Vou pensar em algo para dizer. Mas antes, preciso reformular algumas idéias que pulsam em minha mente.
 
o próximo 

 
 

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