Coluna de Rogel Samuel 
Rogel Samuel é Doutor em Letras e Professor aposentado da Pós-Graduação da UFRJ. poeta, romancista, cronista, webjornalista.
Site pessoal: http://literaturarogelsamuel.blogspot.com/

Nº 162 - 2ª quinzena de setembro 2009
(atualização quinzenal, dias 10 e 25)

As subjetividades camufladas

Fernando Pessoa escreveu em inglês:

WHETHER WE WRITE or speak or do but look
We e are ever unapparent. What we are
Cannot be transfused into word or book.
Our soul from us is infiniteley far.
However much we give our thoughts the will
To be oor soul and gesture it abroad,
Our hearts are incommunicable still.
In what we show ourselves we are ignored.
The abyss from soul to soul cannot be bridged.
By any skill of thoughts or trick of seeming.
Unto our very selves we are abridged
When we would utter to our thooughts our being.
We are ur dreams of ourselves suls by gleams,
And each to each other drems of others' dreams.

E assim foi traduzido por Cunha e Silva Filho:

Soneto 1

SE ESCREVEMOS ou falamos, ou apenas olhamos
Somos sempre indefinidos. O que somos
Não se pode transfundir numa palavra ou livro.
Permanece infinitamente distante de nós mesmos,
Por mais que permitamos à nossa alma pensamentos,
Fica distante a vontade de nossa alma e gestos.
Incomunicáveis ainda são nossos corações.
Aquilo que de nós revelamos não exprime o que somos.
Pois não pode existir ponte no abismo de alma a alma.
Seja qual for a argúcia do pensamento ou aparente artifício.
Apenas somos a síntese de nossas próprias subjetividades.
Quando transmitíssemos a idéia de nosso ser ao nosso pensamento

           Somos os sonhos de nós mesmos, almas de brilhos vagos.
           Os seres entre si sonham com os sonhos dos outros.

A tradução de Cunha e Silva Filho é magnífica.

Que somos nós? Nada, somos sempre o indefinido. A nossa substância não se pode transfundir numa palavra ou nome, numa palavra ou livro, numa transmissão poética. Aquilo que somos permanece para sempre oculto para nós mesmos, oculto e distante, indefinido e oculto somos nós.

Quem somos nós? Nada nos define, nenhum frase ou livro nos pode explicar, pois inexplicáveis somos, inexplicáveis e incomunicáveis, somos fechados em nossos corações ocultos cofres.

Aquilo que revelamos, que confessamos, não, não nos revela, pois não estabelecemos a ponte nesse abismo que nos separa, diz Pessoa.

"Seja qual for a argúcia do pensamento ou aparente artifício.
Apenas somos a síntese de nossas próprias subjetividades.
Quando transmitíssemos a idéia de nosso ser ao nosso pensamento

           Somos os sonhos de nós mesmos, almas de brilhos vagos.
           Os seres entre si sonham com os sonhos dos outros".

Pessoa fala da separação de nossa alma e gestos de nós mesmos, do inexprimível das nossas entranhas existenciais. Somos incomunicáveis, e nos escondemos dentro dessa máscara, desse disfarce de si, sem ponto para o que somos e o que aparentamos ser.

Nossas subjetividades camufladas.

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