Solange Firmino

Professora do Ensino Fundamental e de Língua Portuguesa e Literatura do Ensino Médio. Escritora, pesquisadora. Estudou Cultura Greco-romana na UERJ com Junito Brandão, um dos maiores especialistas do país em cultura clássica.

Mito em contexto - Coluna 06
(Próxima: 5/8)

Gêmeos e a busca da harmonia

Dia e noite, sol e chuva, frio e calor. Vivemos na dualidade. Yin e Yang, vazio e matéria, masculino e feminino são exemplos de símbolos que se unem pela oposição. O movimento do mundo se mantém dinâmico enquanto forças opostas e complementares se equilibram.

Serão os humanos também opostos e complementares? Todos os seres humanos são iguais e, ao mesmo tempo, cada um que nasce é diferente do outro. Até os gêmeos, que muitas vezes parecem iguais, são diferentes.

O tema dos gêmeos sempre fascinou as culturas. Adorados ou temidos, foram imaginados como elementos que exprimem a dualidade de todo ser, por isso foram normalmente retratados como antagonistas. Se um é bom, o outro é mau, se um constrói, o outro destrói. Os gêmeos simbolizam a eterna luta do ser humano dividido entre contradições espirituais e materiais para afirmar sua personalidade, no conflito entre ser e não-ser.

Há vários gêmeos presentes no universo mítico, como Castor e Pólux, Prometeu e Epimeteu, Rômulo e Remo, Osiris e Seth, Apolo e Ártemis, Caim e Abel, entre outros.

Na astrologia, o signo de gêmeos está relacionado com a história dos irmãos Castor e Pólux. Zeus os transformou na Constelação de Gêmeos para celebrar o amor fraterno. Castor era guerreiro e impulsivo, Pólux era músico e sereno. Opostos e complementares que se equilibraram.

O signo de gêmeos expressa, não só nas figuras símbólicas duplas, mas na personalidade, a dualidade e a complementação de características opostas. Dizem que os geminiamos vivem oscilando entre a racionalidade e a intuição.

Conta a mitologia sobre esses gêmeos que Leda casou com Tíndaro, rei de Esparta. Na noite de núpcias, banhava-se no lago encantado quando Zeus difarçou-se em um belo cisne. Leda pôs o animal no colo e o acariciou. Zeus fecundou Leda. Depois, ela foi fecundada mais uma vez pelo marido.

O mito de Zeus e Leda apresenta várias interpretações sobre o simbolismo sugerido pelas metamorfoses. Em outra lenda, Leda fugiu de Zeus e se metamorfoseou em gansa. Alguns associam a imagem do cisne ao desejo e à morte dolorosa, pois o cisne morre cantando e canta morrendo. O cisne traduz em várias culturas a elegância, a coragem e a união dos opostos. As tradições hindu e do Egito Antigo ligam-no ao Ovo do Mundo.

Do ovo de Leda e Zeus nasceram os imortais Pólux e Helena. Nasceram também Castor e Clitemnestra. Os dois primeiros foram considerados filhos de Zeus, os dois últimos filhos de Tíndaro. Castor, mortal como Tíndaro; Pólux, imortal como Zeus. Apesar de terem pais diferentes, os irmãos Castor e Pólux eram conhecidos como Dióscuros, filhos de Zeus. Os dois eram guerreiros inseparáveis e corajosos; participaram de muitas aventuras famosas da mitologia, como a expedição dos Argonautas e o resgate de Helena, raptada por Teseu.

 

Após a morte de Castor em uma batalha, Pólux pediu a Zeus a imortalidade do irmão, para que estivessem juntos sempre. Uma variante do mito diz que Pólux pediu que Zeus tirasse sua imortalidade. Mas, depois que a alma vai para o reino de Hades, não pode voltar. Hades então permite que os gêmeos fiquem juntos seis meses no Olimpo e seis meses no mundo inferior, alternando assim a imortalidade dos irmãos.

 

Os mitos modernos aproveitam a teoria dos opostos que se complementam e tentam unir pares perfeitos, ou almas gêmeas. Muitas pessoas aguardam ansiosamente, entre um amor e outro, a chegada da cara-metade. Há quem arrisca a combinação dos signos do zodíaco na busca do par compatível.

Depende de cada um acreditar se há complementaridade entre signos opostos ou se afinidades garantem a harmonia necessária para que almas gêmeas se encontrem.

A convivência de pólos opostos é tão comum no universo que uma doença caracterizada como “afetiva” é chamada de Transtorno Bipolar do Humor. Nos processos de adaptação no mundo, o indivíduo pode ir de um extremo a outro da sua personalidade, com mudanças bruscas de comportamentos que oscilam entre estados depressivos e eufóricos.

Parece que mais importante que encontrar dois opostos que se tornem gêmeos ou almas gêmeas é o autoconhecimento. O entendimento e o acordo perfeito entre as partes de um todo é chamado de harmonia. Equilibrar os opostos que convivem internamente no próprio ser, conhecer a si mesmo e suas polaridades é o melhor caminho para a harmonia.

Quem sabe depois de encontramos o caminho que nos torne completos, o caminho que una nossas características mortais e imortais, como Castor e Pólux, sejamos como os gêmeos que vivem juntos e imortais nos céus.

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