Raquel Naveira

Escritora sul-mato-grossense, nasceu no dia 23 de setembro de 1957. Formada em Direito e em Letras. Mestre em Comunicação e Letras. Tem vários livros publicados: romance, poesia, crônicas e infantis.       

Coluna semanal de Raquel Naveira
Nº 37, 06/08/2015

VIOLETA

              Violeta era a flor preferida de minha avó.

              – É a flor que representa a humildade, explicava ela. Tão linda, delicada, nasce rasteira, no chão, ao pé das grandes árvores da floresta. Gosto das bem roxas, que parecem guardar um segredo. E o cheiro que fica nas mãos ao macerá-las? É maravilhoso, mas dura só um minuto, nada mais.

              E ajeitava os pequenos vasos de violeta no muro ao redor do tronco da jaqueira do quintal.

              Certa vez, num aniversário, ela reuniu as amigas e lhes deu de lembrança um pequeno frasco de perfume num estojo amarrado com uma fita de cetim e colocou uma minúscula violeta entre as pontas do laço. Achei aquele gesto tão fino, de uma beleza escura e inesquecível aos meus olhos de menina.

              Queria me transformar numa violeta. Prostrar-me no húmus, entre as folhas de grama e florescer fugazmente, anunciando o verão. Abrir-me num roxo mortificado, em pétalas de veludo e mansidão. Vergar de leve num caule amolecido. Enfiar-me nas rachaduras do solo e não erguer nunca a cabeça. Quebrantar-me, sem orgulho, sem soberba, sem nenhum resquício de arrogância.

              Se eu fosse uma violeta, realizaria plenamente meu destino de erva. Na quietude estaria a minha força. Sem murmurações, nem queixas, sofreria minhas angústias e conflitos.

              Modesta violeta em terra fértil, eu reconheceria minhas falhas, não lamentaria o que podia ter e se perdeu por caminhos errados. Rastejaria pelo solo, enquanto meu espírito lilás voaria alto para alcançar a sabedoria.

              Queria ser uma violeta precoce, doce, maleável, que obedecesse à natureza e à minha essência pobre até o fim. Como Cristo obedeceu até a morte de cruz. A capa violeta sobre os ombros na hora da Paixão.

              Submissão de violeta poderia ser o traço mais fundo do meu caráter. Só assim eu alcançaria o topo da inteligência.

              Quanta cordialidade, respeito, dignidade naquela mulher que me ensinou a admirar as violetas.

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