Christina M. Herrmann é poeta, webdesigner. Carioca, vive atualmente na Alemanha. Comunidades no orkut: "Café Filosófico das Quatro", "Sociedade dos Pássaros-Poetas" ambas de entrevista e "Orkultural" em parceria com Blocos Online.
Endereço do Blog, reunindo todos os seus sites e comunidades:
http://chrisherrmann.blogspot.com
Coluna 48 - 2ª quinzena de agosto
próxima coluna: 8/9
UM CONTO, DOIS CONTOS...
Nesta quinzena trazemos dois Contos postados na comunidade Café Filosófico Das Quatro dos autores:
“Uma Mulher à Beira de Um Ataque de Nervos“ de Evelyne Furtado e
“Senhor José Lourenço“ de Maria Lucia de Almeida.
Boas leituras e até a próxima coluna!
* * *
Uma Mulher à Beira de Um Ataque de Nervos
Evelyne Furtado
No consultório do analista, Carmem choraminga e diz que não agüenta mais sofrer:
- Não sei mais se ele me ama. Há duas noites não durmo, pois não paro de pensar nisso.
- Você poderia descrever o que sente? Pede o analista.
- Sinto o chão se abrir. Como se fosse acabar a alegria na minha vida e não fizesse sentido mais viver.
O profissional a observa. Ela esboça um sorriso tenso, encobrindo a emoção que sente. Uma sombra se instala sobre seus olhos. Ele fala:
- O que a leva a pensar que a vida não terá mais continuidade? Você é perfeitamente capaz de buscar outros caminhos e sabe disso. Já conversamos muito sobre o assunto.
- Eu sei, mas não posso me controlar. O medo vai aos poucos tomando conta de mim. Preciso desse amor, não sei viver sem ele.
- O que mais me impressiona é ver uma mulher tão inteligente se deixar levar assim pelas emoções. Você tem sangue espanhol minha filha?
- Tenho sim, Doutor. Por que o senhor pergunta?
- Nada importante, mas tive a impressão, olhando para você, que estava diante de uma personagem de Almodóvar. Uma mulher à beira de um ataque de nervos e sem nenhum motivo concreto para se encontrar assim.
- O senhor acha que não é um bom motivo ele não gostar mais de mim?
- Não é não, senhora! Deve ter muita gente que gosta de você e por mais que doa, não é por apenas uma pessoa não gostar de você que você deve desistir de viver.
Ela parece refletir. A sombra permanece no seu olhar. Endireita-se na poltrona, olhando para o psicoterapeuta e indaga:
- O senhor nunca sofreu por amor?
O médico, não parece se assustar com a impertinência, mas leva alguns segundos para responder.
- Não estou sendo analisado, mas posso lhe dizer que já sofri, sim, mas não morri. Você está me vendo aqui.
- Ah, mas eu sou diferente. Disse Carmem, parecendo uma menina mimada.
- Claro que você é diferente, porém tem tanta força como eu. Encontrará uma maneira de lidar com a situação. Eu lhe asseguro.
Ela deixa as lágrimas correrem por seu rosto. Sente-se uma menina abandonada e imagina o esforço que fará para superar mais uma perda.
O terapeuta olha-a e diz que é importante encarar essa possibilidade, mas que tudo pode ser fantasia dela. Ele não enxerga com muita clareza as causa que a levaram a acreditar que o namorado não mais gosta dela. Enquanto o ouve o rosto dela vai se iluminando aos poucos:
- O senhor acha mesmo?
- Acho sim. Espere e não seja tão ansiosa. Pode não ser nada disso.
Agora os olhos de Carmem já brilham de alívio. O sorriso ilumina seu rosto. Pensa que o analista pode ter razão.
O tempo acabou, antes que o terapeuta pudesse dizer que não tinha certeza de nada. Que tudo poderia acontecer. Ele ainda tentou, mas a cliente decidida já se despedia.
Ela sai do edifício com a alma leve e uma expressão inegável de alegria no modo como se dirigia ao seu carro no estacionamento. Dera uma pausa no sofrimento. Ufa!
Senhor José Lourenço
Maria Lucia de Almeida
Conheci o senhor José Lourenço em uma padaria próxima a minha casa. Um senhor negro, de cabeça grisalha, trajando uma camisa social velha, mas muito limpa e bem passada, e uma calça ‘amarrada' por um cinto que indicava um ex-dono de manequim duas vezes maior. Deveria estar por volta dos 80 anos e conversava num português correto, embora a dicção já estivesse prejudicada pela falta da maioria dos dentes. Dizia à mocinha que atendia no balcão:
“- Ainda hei de ganhar na loteria para comprar um queijo mineiro inteirinho e uma grande barra de goiabada cascão”.
Não tive a menor dúvida, comprei o queijo e a goiabada, feliz da vida por estar tendo a oportunidade de fazer uma caridade, e entreguei ao senhor José Lourenço. Para minha surpresa, ele me olhou com um certo espanto, e ao me agradecer o presente, mal conseguia disfarçar o desapontamento. Foi então que me dei conta do tamanho da minha mancada. Num gesto espontâneo de agrado, eu simplesmente havia ‘apagado' o sonho de uma pessoa de ganhar na loteria e poder comprar o objeto de seu desejo. O sonho de qualquer outra pessoa poderia ser um carro importado, mas o daquele senhor era uma goiabada e um queijo.
Numa tentativa de ressuscitar parte daquele sonho, eu disse a ele que quando ganhasse na loteria poderia comprar uma casa.
“- Uma casa?... eu morava em casa própria. Hoje moro em frente, de aluguel”.
“-Mas o que aconteceu com a casa que era do senhor?”, perguntei.
“- Pois bem, minha casa era toda arrumadinha. Tinha fogão, geladeira, mesa e cadeiras. As coisas todas no lugar. Tinha até minhas ferramentas que eu costumava trabalhar de jardineiro e, às vezes, gostava de capinar uma rocinha. Um dia, sem mais e nem porque, eu escorreguei e bati com a cabeça no chão”.
“- Minha nossa, foi grave o acidente?”, perguntei interessada na história.
“- Não foi nada grave. Não desmaiei e nem perdi a memória. Ficou um cortizinho de nada, só a senhora vendo.
Maria Lucia 21. Aug.(Vor 2 Tagen) Daí apareceu um pessoal, uma gente que eu nem mesmo conhecia e que dizia que era preciso me levar para um hospital. Mas eu continuei insistindo que não havia sido nada, que eu estava bem. Pois foi que me levaram para aquele asilo em Venda Nova e lá me deixaram confinado durante um ano”.
“- Um ano? Mas o senhor não tinha um filho, um parente qualquer que pudesse tê-lo tirado de lá?”.
“- Que nada. Só um irmão que está por aí, perdido nesse mundo. Aconteceu que quando eu voltei, tinham derrubado meu barraco no chão e roubado todas as minhas coisas. Roubaram tudinho. E foi o mesmo homem de quem ganhei por uso capião. Porque meu terreno eu ganhei por uso capião. E o homem é um doutor! A senhora acredita? Ele passa por mim e se curva todo. Não olha no meu rosto. Não olha pros meus olhos. Mas eu rezo sempre por ele. Peço ao nosso bom Deus que o faça cada vez mais rico e com muita saúde para que um dia ele tenha condições de devolver o pedaço de chão deste preto velho aqui. E tenho fé que Jesus Cristo há de me ouvir”.
Naquele momento eu me senti muito pequena, impotente mesmo, perante a maldade existente nesse mundo e insignificante diante da grandeza daquele ser humano, o senhor José Lourenço.
***
LEIA A “SACIEDADE DOS POETAS VIVOS DIGITAL” de BLOCOS
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