COLUNA DE THATY  MARCONDES 
Na área empresarial, trabalhou na implantação de projetos de administração, captação e aplicação de recursos, e ainda em redação e revisão de textos técnicos. Nascida em Jundiaí, reside atualmente em Ponta Grossa/PR, onde exerce o cargo de Conselheira Municipal da Cultura.

1ª quinzena de junho - Coluna 68
(Próxima coluna: 18/7)


O guarda-louça

Os potes de conserva hermeticamente fechados em metáforas, sem pêras, apenas esperas, caldas adocicadas, perdidas no vazio de alguns poemas dietéticos. Uma prosa em cravo, uma crônica apimentada; o rei de copas é carta fora desse baralho: roubaram seu monte de expectativas, delataram seus crimes; me contaram, já, todos os seus pecados, cardápios insossos, carne crua em churrasco assada. Um jogo de alumínio guardando os secos; nas garrafas térmicas, os molhados; na geladeira os condenados. Arde em brasa, no fogão a gás, um leite carnal amornado. No micro (-) ondas de um mar recém salgado, temperado às lagrimas da virgem-dama-menina-moça recém desvirginada pelo amante-pai-namorado.
A louça? Bem, a louça... A louça de flores róseas e detalhes acinzentados pelos cigarros malditos, num prato trincado apagados. Quebrou-se a maioria após o café da manhã, antes do almoço, quando o pai matou a filha, grávida de si próprio, num coito virtual exagerado. Culpa do vizinho, seu namorado, cuja mulher flagrou os dois cometendo o pecado.
Entortou os garfos, asfixiou-se às colheradas, após fincá-la com todas as facas em cortes paralelos, transversais, afiados. Sobre ela alguns cacos. No guarda-louça da memória apenas os copos de cristal da mais pura massa de tomate, usada na cobertura do macarrão, ainda anteontem, no domingo próximo-passado. Uma confusão no tempo: no relógio da parede, meia-noite ou meio-dia. Escorre pelos ladrilhos o sangue da pilha enferrujada, bem sobre o logotipo do supermercado.
Após cardápio tão inusitado, ousa o armário espatifar-se livremente sobre os corpos dos amotinados.
E assim jaz, sobre um simples passional crime, um guarda-louça lascado, que já nada mais esconde, apenas revela, as armas cruas dos desajustados.

A chaleira apita. A rainha louca de espadas pergunta:
— Aceita um chá de jasmim?
— Pois não, senhora. O meu sem espinhos, por gentileza.

Arquivo das colunas anteriores:
1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 55, 56, 57, 58, 59, 60, 61, 62, 63, 64, 65, 66, 67

« Voltar