Mito em contexto - Coluna 38
(Próxima: 20/12)
Entre teias e fios: o confronto entre Atena e Aracne
Fios e tecidos eram importantes na época em que Atenas concorria com as cidades da Ásia pela sua fabricação. Entre os mitos eles também foram muito aproveitados: cada uma das três Moiras tinha um trabalho no tecido da vida, seja segurando o fuso, tecendo ou cortando os fios; Ariadne deu a Teseu um fio de lã como condutor para que ele conseguisse sair do Labirinto; Penélope fiava e desfiava para ganhar tempo com os pretendentes, enquanto esperava o marido Ulisses voltar da Guerra de Tróia.
Fios também aparecem na história de Atena e Aracne. Atena não era reconhecida só como guerreira ou como a sábia filha saída do cérebro de Zeus. A deusa também presidia os trabalhos manuais como a tecelagem e era invocada pelas obreiras.
Aracne era uma simples mortal famosa por seu talento com os fios. Fiava, tecia e embelezava os tecidos como ninguém. A não ser como a deusa Atena. Como Aracne não era nada modesta, vivia se vangloriando de não ter medo de desafiar Atena. Ela parecia esquecer que eram os deuses que concediam aos humanos seus talentos.
A deusa não gostou dos comentários da moça e assumiu a aparência de uma anciã. Fez uma visita a Aracne e a censurou pela sua pretensão em se comparar a uma deusa da qual procedia a indústria humana. Atena foi tratada mal, então aceitou o desafio que a mortal sempre fazia. A competição mostraria quem era a melhor na arte de bordar os tecidos.
As duas fizeram trabalhos perfeitos. Atena representou sua disputa com Poseidon pela proteção da cidade de Atenas, na qual a deusa saiu vencedora. Aracne representou algo desagradável sobre os deuses do Olimpo: as metamorfoses e intrigas amorosas de Zeus.
O trabalho de Aracne estava perfeito, seu único erro foi ter a ousadia de retratar as fraquezas dos deuses. Atena destruiu o trabalho e sua humilhada rival se enforcou no desespero. A deusa sustentou-a no ar para impedir o ato e disse que ela viveria para sempre pendurada daquele jeito.
Aracne realmente não foi vencida, a não ser pelo poder divino. Ela não deveria ter ultrapassado seu limite humano ao querer competir com uma imortal, os deuses não gostavam desse comportamento, sempre punido com um castigo. O castigo de Aracne foi passar a vida como aranha, para sempre tecendo, como escreveu o poeta João Cabral de Melo Neto: “A aranha passa a vida/ tecendo cortinados/ com o fio que fia/ de seu cuspe privado ”.
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