Numa prateleira, abrigo a compoteira
que minha mãe ganhou em suas núpcias.
Tem cores múltiplas e uns motivos chineses.
Guardo nela um chumaço de saudade, cacos de vida,
um certo abraço, uma foto esmaecida, guloseimas.
Algumas vezes, pequenas teimas
e uma pálida esperança que trago comigo da mais tenra idade.
Também um sonho que persigo desde antigamente.
Afora uma lembrança impertinente que não vai embora.
Busca-se uma cadeira de balanço
própria para curtir antigas dores.
Exige-se apenas assento de palhinha
e rangidos constantes de amores dissonantes.
Dá-se em troca uma tevê em cores.
Tonto de tanta tinta,
atento que meu intento tem múltiplos tons.
Trato de traçar outros traços,
riscar espaços com giz e carvão.
Só então pressinto: não o fiz em vão.
Não peço régua e compasso,
me desfaço da trena.
Meu passo, não meço.
Se tropeço,
refaço a cena.