Sua presença

Você me tira o ânimo, a praia, o sol, o ar, meu espaço. Contorna-me de grades e fecha o cadeado, me sufoca, apaga minha luz, delimita minhas formas, me veste de saias justas e blusas decotadas até que se mostrem meus seios e meu coração ressequido, ressabiado, ressecado, retraído, semi-arrancado, repartido... Sobressaltado.

Uma noite espessa, um véu de veludo pesado, azul-da-Prússia quase negro, denso, abafado, embolorado fingindo estrelas foscas, quase nulas, de brilho pouco e quase apagado.

No ar uma gripe, dessas que ressecam a boca, bloqueiam a traquéia, abaixam o volume da voz que nada quer dizer, ou sussurrar, ou gritar, ou grunhir... Apenas descansar o grifo atravessado, amainar o ardido pimenta que pede um ar fresco, refresco hortelã – ao menos uma pastilha Valda.

No corpo – na zona abaixo do Equador –, o desequilíbrio me trai, te atrai, nos envolve em mares mortos, quase esquecidos líquidos espessos e desregrados. Se não há mais amor, se não sinto atração, qual o motivo dessa devassidão, desse falso (in)desejo que me escorre pela pernas?

Como transformar-nos novamente em amantes após tantas taras confessadas na alcova, tanta mansidão depois do desejo, tanta satisfação após a saciedade? Como ressurgir das cinzas uma amante fênix, digna de nota mil em laços e enlaces, em braços e pernas, em carne e sangue?

Como me reunir – duas repartidas que agora me formam? Como te convencer: não te amo mais?... Mas, vez em quando, uma boa transa até que anima!

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