2ª quinzena de setembro - Coluna 75
(Próxima coluna: 3/10)
A moça do tempo
A moça do tempo não vem mais. Talvez por falta de tempo pra prever o tempo; talvez por falta de alento; talvez por conta de um invento que lhe substitua as atribuições.
Não é fácil acertar previsões de tempo – isso não é mesmo! Se ela indicar um guarda-chuva, não se esqueça do maiô na bolsa; se ela disser que vem por aí uma forte onda de calor, convém uma galocha pra prevenir; e se o futuro prometer seca, um barquinho estacionado à porta vai bem.
A moça do tempo se enganou no tempo, ficou na janela, qual Carolina, aquela; a vida estava passando, escorrendo impune por seus dedos. Ela deu um salto mortal, pulou pra rua, caiu no colo de um moço-poeta de chapéu coco, aprendiz do panteão grego, trabalhador da arte concreta, prosa indiscreta, e lá ficou. Parece até brincadeira de criança: “Estátua!”. E a moça do tempo ficou estática, parada no tempo. Agora, sentada no meio fio, vê os passantes, os passageiros, os transeuntes, mas ainda não enxerga a vida que escapa se afogando nas águas das chuvas, que correm desvairadas sob seus pés descalços e seu olhar distraído, como quem nem vê o tempo passar.
A moça do tempo se perdeu no vazio, se esquentou no frio, se molhou na seca... E entre raios e trovões, escapando por entre dias ensolarados, marés altas e secas encharcadas, ficou encantada pelos olhos do amor.
Errou a previsão de novo!
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