Solange Firmino

Professora do Ensino Fundamental e de Língua Portuguesa e Literatura do Ensino Médio. Escritora, pesquisadora. Estudou Cultura Greco-romana na UERJ com Junito Brandão, um dos maiores especialistas do país em Mitologia.

Mito em contexto - Coluna 51
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Trégua para os Jogos

Historicamente localizamos os primeiros Jogos Olímpicos no ano de 776 a.C., alguns estudiosos dizem que eles já eram realizados no século IX a.C.. Uma das teorias míticas sobre o surgimento dos Jogos considera sua origem nas competições fúnebres em honra a Pélops, outra conta que o jovem Zeus foi hospedado por Crono e resolveu disputar o trono. Zeus derrotou o deus do tempo e instituiu os Jogos para comemorar.

Na Ilíada de Homero há menções a jogos fúnebres organizados durante a Guerra de Tróia pelo herói Aquiles em memória ao amigo Pátroclo, morto por Heitor. Na Eneida há relato de jogos em honra Anquises, pai do herói romano Enéias. Nos jogos fúnebres aconteciam disputas, costume que provavelmente evoluiu até resultar nos Jogos Olímpicos.

Além das competições em Olímpia, havia outras realizadas em cidades diferentes, e homenageando outros deuses Os Jogos Ístmicos honravam Poseidon no santuário de Corinto. Os Jogos Nemeus eram realizados em honra de Zeus em Neméia. Os Jogos Píticos celebravam Apolo no santuário de Delfos e aconteciam a cada quatro anos, nos intervalos das Olimpíadas. Além das competições esportivas, esses jogos se diferenciavam pelas competições artísticas. A lenda diz que foram instituídos pelo próprio Apolo para comemorar a vitória sobre a serpente Píton, antes de assumir o controle do Oráculo .

Os gregos se dividiam de em cidades-estados que, mesmo independentes, viviam em disputas. Os Jogos eram uma boa forma de se unirem. Quando se organizavam para esses eventos, era um acontecimento em que se via a unidade nacional. Os jogos celebravam a paz, mesmo a paz momentânea. Os mensageiros anunciavam a celebração e proclamavam a trégua sagrada. Era um sacrilégio estar com armas nesses eventos.

Os prêmios tinham valor simbólico: a coroa de louro e o ramo de oliveira. Mas o vencedor olímpico era bem recompensado ao regressar a sua terra natal com honras e privilégios. Os poetas o tornavam famoso por toda a Grécia quando o imortalizava em canções. O nome do vencedor ficava inscrito no catálogo oficial no ginásio e quem tinha condições contratava um escultor para fazer sua estátua.

Mas a rivalidade entre as cidades-Estados nunca terminava e o período romano também ajudou a desvirtuar os ideais gregos das Olimpíadas, como o caso em que o imperador Nero resolver participar. Seus adversários desistiram com medo dos castigos que receberiam se vencessem. O governante de Roma correu sozinho e se tornou campeão olímpico.

As Olimpíadas foram perdendo o caráter religioso ou ideológico. Em 391 d.C. o imperador Teodósio proclamou o Cristianismo religião oficial do Império Romano e decretou o fim das manifestações pagãs, entre elas os Jogos Olímpicos. Olímpia foi abandonada, destruída por mãos humanas e enchentes e só foi redescoberta em 1776 pelo arqueólogo Richard Chandler. No final do século XIX, quando os esportes ganhavam espaço na sociedade européia, o pedagogo Pierre de Fredy, ou Barão de Coubertin, reeditou o evento dos Jogos Olímpicos. Coubertin criou e presidiu o Comitê Olímpico Internacional (COI), que liderou até morrer, em 1937.

Em 2008, ao contrário da tradição, os Jogos Olímpicos não pretendem unir o mundo em paz, pelo menos não é o que parece estar acontecendo, com tantos conflitos em torno da sua realização em Pequim. É importante vermos expostos problemas relacionados aos Direitos Humanos na China e uma atenção internacional à questão do Tibet mas, por outro lado, como continuar honrando a tradição da trégua olímpica no contexto atual?

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