COLUNA DE VÂNIA MOREIRA DINIZ

Nº 90 - 6/7/2010
(próxima: 6/8/2010)

          

A cada passo uma lição

           Acordei muito bem disposta depois de dias que foram cansativos, muito trabalho e preocupações. E o Sábado apesar de nublado, prometia nascer um sol cuja luz se escondia já visível.  Estava feliz de rever muitas pessoas que eu pretendia visitar na cidade satélite de Brasília.  Antevi o rostinho das meninas quando recebessem o que algumas delas me disseram ser um desejo especial: um mimo em forma de brinquinhos delicados para que enfeitassem as orelhas e se olhassem no espelho. Estava levando muitos deles e isso não animava a elas mais do que a mim.. Vaidosa como era, compreendia perfeitamente o que elas sentiam.
           Quando cheguei algumas delas que brincavam ou conversavam na rua em frente às suas casas já me viram e se acercaram. Escolhi uma casa de uma senhora, Dna Alzira que logo permitiu no pequeníssimo cômodo a reunião das meninas.
           Dei a cada uma delas algumas coisas próprias da idade e para que se enfeitassem como almejavam e definitivamente constatei que ali nesses sábados especiais, só ternura chegava ao meu coração. Enquanto via as garotas encantadas procurarem num espelho quebrado a própria imagem, conversei com a dona da casa e soube que sua filha já dera à luz a um menino. E queria logo vê-la. Mas percebi o olhar entristecido da dona da casa. Ela pediu que eu a seguisse e cada vez sentia a dolorosa situação daquela mulher guerreira que num casebre que mal dava para duas pessoas morava com sete filhos. E enquanto as meninas gritavam de alegria por uma simples lembrancinha com o amor próprio em alta ao se verem bonitas com os brincos ou pulseirinhas entrei com Dona Alzira num espaço separado por algo que fazia às vezes de cortina e vi com meus próprios olhos a jovem que acabara de colocar no mundo uma criança.
           A cama era muito baixa com um arremedo de colchão onde ela mal podia se equilibrar para dar de mamar ao nenê. E Luana as lágrimas descendo pelo rosto mal parecia a garota que eu conhecera. Estava inchada, os lábios amarelados onde faltava sangue e sua linda cor morena estava amarelada. Gemia a cada movimento seu ou da criança. A mãe relatou-me então o desespero que foi na hora que ela sentiu as primeiras dores e a dificuldade de arranjar um hospital onde quisessem interná-la. Perto da casa dela não conseguiram e o marido a levou para outra cidade satélite. Quando me viu sensibilizada passou a mão em meus cabelos e disse com  carinho indizível:
           — Calma, o pior já passou você vai ver...
           Luana havia sofrido demasiado, acho que já passara a hora de nascer e o bebê provavelmente estava também se ressentiu. Com tudo isso, as lágrimas descendo depois de deixar alguns alimentos, balas e doces para as crianças e abraçar a mãezinha e Dona Alzira  telefonei para meu amigo e médico ginecologista. Pedi que viesse me encontrar naquele lugar de tantas ocorrências tristes e de gente corajosa dando lições de vida para ver o que podia fazer. Mais uma vez eles me davam exemplo de aceitação, de coragem e de força e eu aprendia  cada vez mais no livro complexo  da vida.


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