Coluna de Rogel Samuel 
Rogel Samuel é Doutor em Letras e Professor aposentado da Pós-Graduação da UFRJ. poeta, romancista, cronista, webjornalista.
Site pessoal: http://www.geocities.com/rogelsamuel

Nº 140 - 2 ª quinzena de setembro 2008
(próxima coluna: 10/10)

O 1º capítulo deste importante romance mereceu matéria de página inteira no Jornal "Amazonas em Tempo", em 13/12/07.
Clique aqui para ler a reportagem na íntegra

FOTOS DE ALGUNS PERSONAGENS (FILETO PIRES FERREIRA, EDUARDO RIBEIRO, W. SCHOLZ, ETC.) E LUGARES DO "TEATRO AMAZONAS" EM: http://www.flickr. com/photos/ 12439475@ N05/sets/ 72157603842512154/

"TEATRO AMAZONAS"
(Romance inédito)


           20. O TEATRO DE OURO PURO


            Um dia Eduardo Ribeiro recebeu um requerimento de Manuel Coelho de Castro. Nele o construtor tratava dos andaimes para a montagem da cúpula do Teatro Amazonas e lista do pessoal empregado. No fim, solicitava uma audiência com o Governador.

            Ele entrou esbaforido na sala do chefe de Estado. Era um homem baixinho, gordo, redondo, cara queimada de sol e usava uns grossos bigodes brancos que ele não cessava de cofiar. Vestia terno de linho bege, gravata borboleta azul, sapatos de verniz. Suava muito, enxugava-se com um grande lenço de cambraia branca, que punha e tirava do bolso a todo momento. No dedo exibia um anel de ouro demasiado grande para sua pequenina mão gorda.

            O Governador mal o olhou.
            Eduardo Ribeiro era homem seco, sério, pouco amistoso. Vestia sua inseparável farda militar. Lia e assinava papéis.
             – Pode sentar,  – disse ele sem levantar a cabeça para Manuel, apontando uma cadeira que havia em frente à sua mesa.
            Aquele procedimento inamistoso atraía para o mulato maranhense uma multidão de inimigos na elite amazonense. Após uma audiência, quem saía do Gabinete do Governador era mais um inimigo, mesmo que seu pleito tivesse sido atendido. Eduardo Gonçalves Ribeiro era um mestre em fazer inimigos e desagradar os amigos.
             – O que deseja? – perguntou o Governador sem olhar para o comerciante.
            O gordo Manuel parou, pigarreou, e com a mais gentil das vozes começou a falar. Via-se que ele tentava não irritar o Governador, que tinha uma personalidade difícil:
            – Senhor Governador...  – começou Manuel de Castro  – todos esses anos eu tenho tocado as suas obras do teatro, junto com os outros contratantes, tenho feito a minha parte com o maior dos zelos...
            – Vamos direto ao ponto, disse asperamente Eduardo Ribeiro.
            Manuel ficou intimidado e quase não conseguiu falar:
            – O Senhor pode consultar Crispim do Amaral... é impossível armar um andaime de tamanhas proporções... os custos... por aquele preço... desde que Vossa Excelência mandou implantar aquela gigantesca cúpula de vidro policromado no teto do teatro é impossível e...
            – O quê? – gritou Eduardo Ribeiro. O quê? Pensa que podemos dispor das verbas públicas à vontade! Eu tenho pressa! Eu tenho pressa!
            Naquele momento, entrou sem ser anunciado, o secretário de estado Fileto Pires Ferreira, que foi falando:
            – Governador, ele tem razão, disse Fileto imediatamente. Eu tenho acompanhado de perto os custos daquela armação e estou convencido que é impossível a construção do andaime por cima daquela estrutura sem que faça uma reestruturação na tabela de custos. Vamos gastar o dobro dos materiais...
            – Fileto, gritou Eduardo, parece que este teatro está... Fileto! O Teatro Amazonas não é de ouro puro! Fileto! Eu já nem sei quanto já se gastou na construção do teatro...
            – Sim, disse firme e calmamente Fileto Pires Ferreira. Mas é um dos maiores e mais belos teatro do mundo, construído em plena selva amazônica. Deve estar custando o dobro do que custaria se fosse construído em Paris...
            – Está bem, está bem, - disse Eduardo Ribeiro. E num tom grosseiro, falou para Manuel de Castro:
            – Entenda-se com o Secretário Fileto, Senhor.
            E os dois saíram depois de se despedirem do Governador.
            Eduardo não respondeu.


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