COLUNA DE THATY  MARCONDES 
Na área empresarial, trabalhou na implantação de projetos de administração, captação e aplicação de recursos, e ainda em redação e revisão de textos técnicos. Nascida em Jundiaí, reside atualmente em Ponta Grossa/PR, onde exerce o cargo de Delegada na área Literária (Secretaria Municipal da Cultura).

2ª quinzena de agosto - Coluna 95
(Próxima coluna: 3/9)


O texto, este esquecido

Eu não sei muito bem sobre o que vou escrever ou se vou conseguir escrever agora. Acho que estou apenas atendendo à minha compulsão ou falando com o meu melhor amigo: o texto. O texto que formo escrevendo letras que se transformam em palavras, em frases, em histórias ou em simples desabafos cotidianos.

Hoje amanheci amando o texto, pois preciso dele mais do que tudo nessa vida, neste momento. Tenho que me abrir com ele. Ele não me responde, mas, acho que me ouve e talvez até me entenda.

Amanheci chorosa, as lágrimas estão embaçando os meus olhos, mas eu teimo em me abrir com o texto.

Sabe, texto, eu tenho quase cinqüenta anos, então, não sou mais uma menina, uma mocinha ou uma bela e gostosa balzaquiana. Ainda tenho, até, um certo charme, quando tenho ânimo prá me arrumar prá sair, prá passar um batonzinho, um lápis nos olhos ressaltando o verde. Parei de estudar ainda menina, por contingências da vida, prá ir trabalhar - isso aos dezessete. Fiz de tudo um pouco - acho que sou uma espécie de "Bom-Brill", em se tratando de trabalho, por conta da luta pela sobrevivência.

As coisas melhoraram, em parte, quando me casei pela primeira vez. Tornei-me mãe em tempo integral, pude curtir meu filho, mas sempre arrumando um "biquinho" prá ter uma graninha só minha - força do hábito de ser auto sustentável, talvez. Em certa época, pouco antes do marido falecer, me senti realizada profissionalmente, trabalhando com textos. Não como escritora, como eu gostaria, mas como redatora de textos técnicos para empresas. Além da grana ser legal, meu texto era claro e objetivo e, em pouco tempo, peguei a coordenação de um grande projeto, envolvendo, inclusive, contratação e treinamento de pesquisadores da área. O trabalho foi entregue e nunca mais "pintou" nada do tipo. Sem trabalho e sem marido, que morreu após meses de maratona hospitalar de uma doença, para mim, até hoje, um tanto quanto "inexplicável".Apesar de toda experiência e status de excelente profissional que adquiri, nunca mais fui chamada. Talvez, até, pq me faltasse o principal para atuação na área: o diploma!

Virei pensionista, mas, mesmo assim, teimando em trabalhar fora, pois eu odeio serviço de casa. Logo de início, eu realmente tive que trabalhar, pois a quantia era minguada e insuficiente. Depois, melhorou um pouquinho e achei que estava na hora de controlar bem os gastos e tentar viver dentro da minha pensão. Primeira providência: sair de São Paulo, pois, apesar de ser uma cidade onde tem tudo - e tudo perto -, a vida, de um modo geral, é muito cara e extremamente insegura para quem tem um filho pré-adolescente. Viemos para o interior do Paraná - meu filho, meu segundo marido e eu. As coisas iam bem, até que resolvi me dedicar à escrita em tempo integral. Foi quando minha mãe - que ficou sozinha no mundo, juntou-se a nós e meu marido resolveu ser "técnico de computadores". Todo começo é difícil e, ainda mais numa cidade pequena, o dele foi dificílimo.

Mas, hoje, eu dei de cara com o meu presente: o marido sai prá trabalhar, sem horário, usando o meu carro; meu filho já é quase um homem, com 16 anos, minha mãe é uma déspota que vive a disputar o andamento da casa comigo e eu... Eu? Aos quase cinqüenta anos, virei operária do fogão e do tanque, provedora da casa e responsável pelos pagamentos, além de "saco de pancada" - tudo que acontece de errado, com todos, é culpa minha.

As minhas unhas estão horríveis, meu cabelo anda sem corte, sem pintura e sem brilho; minhas roupas são quase trapos fora de moda, compradas, ainda, no tempo em que morávamos em São Paulo (há uns quase quatro anos atrás). Não consigo ser escritora, pois a toda hora sou interrompida pela obrigação de algum afazer doméstico (coisa que eu detesto, como já falei anteriormente).

Preciso dar uma guinada em tudo isso! Preciso de objetivos! Preciso ressuscitar dos mortos! Mas... quem daria emprego a uma mulher mal cuidada e na minha idade?

Escrever um livro? Quem sabe, assim, eu resgatasse o meu respeito próprio e o respeito pelo meu trabalho aqui em casa? Nem pensar! Se os bons escritores não tem quase chances de publicar seu primeiro trabalho, o que dirá eu, uma escritora medíocre, sem a intelectualidade e o domínio necessários das palavras? E também sem diploma!

Aí eu venho prá cá, me sento no computador, escrevo um monte de palavrinhas, sou publicada em um monte de sites da internet, troco idéias e e-mails com vários outros pretensos escritores em listas de literatura e... no real, não acontece nada!

Hoje estou me sentindo presa - não quero mais ficar retida dentro do computador, passeando apenas por pontos turísticos e literatos virtuais, ou dentro da telinha dos computadores alheios: quero sair! Preciso me tornar real! Texto, me leva daqui!


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