JOSÉ NÊUMANNE
Jornalista, editorialista do Jornal da Tarde, comentarista da Rádio Jovem Pan e do SBT, poeta e escritor com diversos livros publicados, entre eles: Solos do silêncio – poesia reunida  e O silêncio do delator, agraciado com o Prêmio "Senador José Ermírio de Moraes", da ABL. Leia novo texto de Ronaldo Cagiano na fortuna crítica do autor e conheça a poesia do colunista, cujo CD agora tem opção de download. Site: http://www.neumanne.com

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O Evangelho segundo Lula

As boas almas têm identificado um humor diferente no presidente reeleito. Em 2002, após derrotar o tucano José Serra , ele emocionou-se, mostrou-se eufórico e deu a seus críticos preconceituosos a chance de recordar o velho ditado que reza: "Quem nunca comeu mel quando come se lambuza". Nada mais justo, contudo, para um homem do povo que se lambuzar no mel do poder, normalmente tão distante do brasileiro pobre quanto os anéis de Saturno. Agora, não! O presidente reeleito com 20 milhões de votos a mais que o adversário tucano no segundo turno, Geraldo Alckmin, age com a naturalidade de quem está sentado à direita do Pai desde as calendas gregas ou mais: desde a construção da Esfinge pelos antigos egípcios. Nada mais natural: quem já provou do mel do poder sabe o gosto que ele tem e não precisa mais se lambuzar.

Na primeira subida na rampa, Sua Excelência fez-se acompanhar de velhos companheiros de jornada do Partido dos Trabalhadores. Mas ao longo do caminho suas empreitadas das Operações Tabajaras na gestão federal os foram levando à desgraça: José Dirceu, Antonio Palocci e agora Luiz Gushiken caíram. Hoje, despido do macacão de sindicalista e dispensado das obrigações de socialista, o presidente volta às suas origens messiânicas e passou a se considerar um interlocutor privilegiado de Deus. Na inauguração de uma ponte na Venezuela, Sua Excelência prometeu ao amigo e ídolo Hugo Chávez, ele também em luta pela própria reeleição, um apoio impossível de dar: transferir os próprios votos: "O mesmo povo que elegeu a mim certamente irá te eleger presidente da Venezuela". O mesmo Lula que havia prometido estender o Mercosul a um território entre a Terra do Fogo e a Patagônia, regiões ao sul da vizinha Argentina, passou a anunciar o milagre da transposição dos povos. Isso certamente será algo mais complicado de fazer que multiplicar pães, mas não pode ser impossível para alguém que atribui a Deus e a não mais ninguém o próprio triunfo eleitoral. Que expressou, para ele, uma resposta à "zelite", composta pela imprensa conservadora, os empresários, os ex-governantes e os banqueiros, estes ingratos que viveram à tripa forra sob sua égide e resolveram votar no adversário numa ingratidão impossível de compreender.

A tal da "zelite" tem uma sede em pleno cocoruto da Avenida Paulista na maior cidade do País. Como se sabe, apesar de ter sido criado e formado como político em São Paulo, o presidente de todos os brasileiros apostou firme na aversão da parcela majoritária do restante do País contra a Unidade que era tida como a locomotiva do trem da Federação. E se deu bem. Agora é o principal responsável pela palavra da moda no Planalto Central do País: a "despaulistização" da decisão política.

No Evangelho do segundo governo Lula, do qual o paulista oriundo da "zelite" cearense Ciro Gomes é o profeta, Deus será eternamente louvado, mas seu principal pregador, São Paulo, será sempre execrado.

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