JOSÉ NÊUMANNE
Jornalista, editorialista do Jornal da Tarde, comentarista da Rádio Jovem Pan e do SBT, poeta e escritor com diversos livros publicados, entre eles: Solos do silêncio – poesia reunida e O silêncio do delator, agraciado com o Prêmio "Senador José Ermírio de Moraes", da ABL. Leia novo texto de Ronaldo Cagiano na fortuna crítica do autor e conheça a poesia do colunista, cujo CD agora tem opção de download. Site: http://www.neumanne.com
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Os cúmplices do monstro
Nem a família de Ademir Oliveira Rosário consegue entender por que lhe tem sido permitido sair periodicamente (uma dessas saídas chegou a durar 20 dias) da Casa de Custódia de Franco da Rocha, nome pleonástico do hospício penitenciário, onde vive, para visitá-la. Ele é um doido perigoso e seus parentes próximos sabem disso. Já foram relacionados pela polícia 21 adolescentes molestados sexualmente por ele. Os brutais assassinatos dos irmãos Francisco, de 14 anos, e Josenildo Ferreira de Oliveira, de 13, lhe valeram a terrível alcunha de “Monstro da Cantareira”.
Aos 19 anos, foi detido por 2 meses e liberado após ter sido condenado a 1 ano e 9 meses de reclusão, em regime aberto. Há 16 anos, cometeu o primeiro assassinato e por causa dele foi trancafiado na Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté, da qual foi solto antes de ser julgado. Livre como suas vítimas em potencial, roubou e abuxou sexualmente de uma delas até que, em 1999, foi condenado a 7 anos pelo homicídio 11 anos de prisão pelo roubo seguido de atentado ao pudor. Se estivesse cumprindo pena, os irmãos Oliveira estariam vivos.
Mas não: o psicopata perigoso foi beneficiado por um programa de “desinternação progressiva” em São Paulo e transferido para perto de seus familiares, em Franco da Rocha, na Grande São Paulo. Em teoria, ele passaria a ser avaliado com severidade por especialistas em psiquiatria e criminologia e, por isso, pode passar temporadas com a família. Também em teoria, essas visitas teriam de ser vigiadas. Como se vê agora, tudo isso é uma fantasia. A juíza substituta Regiane dos Santos considerou letra morta os laudos dos especialistas, que alertavam para a periculosidade do interno e lhe deu licença para sair. Ele aproveitou para seviciar e matar meninos. Agora a juíza e a direção da Casa de Custódia calam sobre o sangue derramado, refugiando-se no expediente burocrático do silêncio imposto por sua condição funcional.
O “Monstro da Cantareira” não sabe o que faz. Mas só o faz porque o Estado brasileiro é negligente, insensível e incapaz. Os meninos foram mortos na Cantareira por um louco, mas quem o armou foi um sistema ainda mais insano que, em nome da proteção caridosa ao carrasco insano, condena vítimas sãs e inocentes ao risco da morte impune. A juíza e os diretores do hospício deveriam ser condenados a a ouvir diariamente os gritos lancinantes de dor da mãe privada da companhia dos filhos. Até aprenderem.
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