COLUNA DE THATY  MARCONDES 
Na área empresarial, trabalhou na implantação de projetos de administração, captação e aplicação de recursos, e ainda em redação e revisão de textos técnicos. Nascida em Jundiaí, reside atualmente em Ponta Grossa/PR, onde exerce o cargo de Delegada na área Literária (Secretaria Municipal da Cultura).

2ª quinzena de novembro de 2008 - Coluna 120
(Próxima coluna: 3/12)

MISCIGENAÇÃO
(no Dia do Combate ao Racismo)

                Essa é uma história do arco da velha, como diria minha avó. Não tenho culpa se a memória de minha mãe, nascida e criada no interior, é privilegiada – embora às vezes falhe um cadinho, por desatualização de detalhes e falta de visitar a cidade –.

                Mas, vamos lá, o que importa é o conteúdo central dessas lembranças. E vejam que nem são lendas urbanas, mas, sim, acontecimentos reais, embora às vezes um pouco rebuscados ao bel prazer desta que vos relata acontecimentos idos.

                Essa é dos tempos da chegada da Krüppe, em Jundiaí/SP. Quando da instalação da empresa na cidade, vários empregados vieram da Alemanha para auxiliar na formação do quadro administrativo. Um desses jovens e promissores talentos apaixonou-se pela secretária contratada para atendê-lo. Muito culta, educada, bonita e com um fluente alemão, não foi difícil convencê-la a aceitar o pedido após poucos meses de namoro. Numa cerimônia simples, casaram-se apenas na presença de poucos familiares e escassos amigos. Ela continuou trabalhando na empresa, até que ficou grávida. Uma linda menina nasceu, e, para espanto geral, após visitar mãe e criança na maternidade, o marido, sentindo-se traído, proibiu-a que voltasse à casa e afirmou, aos berros pelos corredores, que não registraria aquela criança, fruto da traição da esposa. Imediatamente procurou um advogado, colega seu na empresa, e entrou com um processo por adultério – coisa considerada justa, naqueles tempos –.

                No dia da audiência, para surpresa geral, a sentença, concluída por unanimidade, faria com que o jovem voltasse à sua terra natal após ser absurdamente repreendido pelo juiz e pelos olhares da corte. A pobre mãe simplesmente conseguiu lhe tirar tudo, absolutamente tudo, além de uma polpuda pensão para garantir o bem estar e a educação da filha. E olhem que naquele tempo nem existia exame de DNA ou outras modernidades.

                Ocorre que a criança nasceu morena, mulata mesmo. E este o motivo da certeza obtusa do marido. No dia do julgamento, uma das testemunhas da moça-mãe-secretária-esposa-ré era sua avó, uma negra ex-escrava, que por morar longe de Jundiaí e estar em idade avançada, não compareceu ao casamento da neta.


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