Jornalista, editorialista do Jornal da Tarde, comentarista da Rádio Jovem Pan e do SBT, poeta e escritor com diversos livros publicados, entre eles: Solos do silêncio – poesia reunida e O silêncio do delator, agraciado com o Prêmio "Senador José Ermírio de Moraes", da ABL. Leia novo texto de Ronaldo Cagiano na fortuna crítica do autor e conheça a poesia do colunista, cujo CD agora tem opção de download. Site: http://www.neumanne.com
Coluna de 27/3/2008
(Próxima coluna 3/4)
Há algum tempo, prefaciei o livro A velha era do novo, de meu primo Gaudêncio Torquato. Juca de Oliveira leu o livro no carnaval e elogiou o texto. Aí me lembrei que não o tinha distribuído. Não é, portanto, novo, mas ainda assim me parece oportuno. - José Nêumanne
Teoria e prática do Brasil rural e urbano
O professor e jornalista Francisco Gaudêncio Torquato do Rego é um observador privilegiado da cena política brasileira.
Sua origem é o sertão remoto do Nordeste - o oásis verde e frio de Luís Gomes, Rio Grande do Norte, no qual o Diabo perdeu as botas e nunca vai conseguir achar porque as brenhas daqueles sovacos de serra nos confins entre a Paraíba, ao sul, e o Ceará, a oeste, exigem tal ciência do caminhante que nem o Tinhoso, velho de todo, de idade infinita, neles ousaria arriscar-se a se perder. Mas ele deu com os costados na maior metrópole do País, da América Latina, daqui a alguns anos do mundo, segundo os demógrafos, e em São Paulo de Piratininga parou para trabalhar, pensar e escrever. De tal forma que se sua origem é o ermo rural, cenário por excelência daquilo que o Dr. Tancredo chamava de “grotões”, seu destino manifesto é a metrópole. Desse jeito, ele terminou por repetir o trajeto que a grande maioria da população brasileira fez dos anos 40, quando ele nasceu, para este século iniciante, no qual vivemos. Não é para qualquer um ter essa vivência duplamente serrana, mas do sertão na infância e da urbe na maturidade. E o leitor deste livro vai perceber que o professor Torquato do Rego tirou partido desse privilégio, fruindo como pôde essa contingência.
E ainda tem mais: também trafega o moço entre teoria e prática. Seu pai, também Gaudêncio, comerciante de prestígio no sertão, sujeito bem assentado na vida e manhoso no trato com mulheres, clientes e eleitores, formou prole grande, à qual destinou, como sói ocorrer naquela região, os canudos do bacharelato e os escaninhos da burocracia no serviço público. Ou seja, Gaudêncio, o filho, conviveu muito de perto com os chefes políticos de sua cidade: alguns deles, violentos, lúbricos, apaixonados, capazes dos gestos extremos pela disputa do mínimo poder, foram criados com ele sob o mesmo teto – eram seus irmãos. Com jeito para as letras, contudo, seu rumo só podia ser a paróquia ou a escola. Pouco afeito ao celibato, o ex-seminarista fez-se, é claro, professor e em São Paulo seguiu longa carreira no magistério: mestre de jornalistas do batente, integra a colenda comunidade acadêmica da mais prestigiada universidade do País, a sacrossanta congregação dos uspianos, fazendo-se colega de Florestan Fernandes e Miguel Reale, Antonio Candido e Fernando Henrique, Francisco Weffort e Octavio Ianni. Não é, contudo, apenas um teórico do marketing político, sua especialidade na Escola de Comunicação e Artes, mas também comanda um escritório de assessoria e consultoria de marketing, vivendo entre a teoria sublime das classes e a prática sórdida das campanhas eleitorais.
Resulta, pois, dessa visão múltipla do menino sertanejo que se fez homem na metrópole e do prático da política, da qual conhece a transição do jugo do coronel rural à submissão ao marketing deste mundo globalizado pelas antenas da tevê, seu pensamento organizado, coerente, arguto e sensível. Costurando idéias próprias com talento de escriba, aperfeiçoado em aulas de latim no seminário e na prática do jornalismo interpretativo (seu nome é uma grife que corre o Brasil inteiro nos períodos eleitorais ou nas entressafras de votos), ele nos traz agora esta coletânea de reflexões iluminadas pelo sol bruto de Luís Gomes e matizadas pela penumbra do bas fond político desta São Paulo de Piratininga.
Agora só falta dizer o óbvio: diante de tudo isso, privilegiado não é ele, que reúne o rural o urbano, o prático e o teórico, mas o leitor de seus textos aqui coletados, nos quais o Autor aborda a realidade brasileira, chamando a atenção muitas vezes para o que ela tem de mais óbvio e que ainda assim parece nunca ter sido revelado antes. Usufrua-o, pois!
_______________
Colunas anteriores:
01, 02, 03, 04, 05, 06, 07, 08, 09, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 55, 56, 57, 58, 59, 60, 61, 62, 63, 64, 65, 66, 67, 68, 69, 70, 71, 72, 73, 74, 75, 76, 77, 78, 79, 80, 81, 82, 83, 84, 85, 86, 87, 88, 89, 90, 91, 92, 93, 94, 95, 96, 97, 98, 99, 100, 101, 102, 103, 104, 105, 106, 107, 108, 109, 110, 111, 112, 113, 114, 115, 116 , 117, 118, 119, 120, 121, 122, 123, 124, 125, 126, 127, 128, 129, 130 , 131, 132, 133, 134, 135, 136, 137, 138, 139, 140, 141, 142 , 143, 144, 145, 146, 147, 148, 149, 150, 151, 152, 153, 154, 155, 156, 157, 158, 159, 160, 161, 162, 163, 164, 165, 166