"POETICIDADES E OUTRAS FALAS"
RUBENS DA CUNHA

Reside em Joinville, SC. Autor de "Campo Avesso" e "Visitações do Humano". Acadêmico de Letras. Escreve semanalmente no Jornal A Notícia e coordena o Grupo de Poetas Zaragata. Na Web tem o e-book: "A busca entre o vazio", disponível para download,
na URL: <http://www.arcosonline.com/index.php?option=content&task=view&id=146&Itemid=>.
Blog "Casa de Paragens": <www.casadeparagens.blogspot.com>.

Coluna de 9/3/2012
(próxima coluna: 26/3/2012)

NOMES DOS SANTOS NAS FOLHINHAS

Havia na minha infância um tipo de calendário, ou folhinha, que nomeava um santo para cada dia. Talvez ainda exista, mas nunca mais vi algo assim. O que eu achava fascinante era que muitos nomes dados aos filhos vinham dos nomes desses santos. Eu me lembro que o santo do dia do meu aniversário era Tomás. Se meus pais fossem menos criativos eu poderia ter esse nome. Para mim, Tomás era um nome muito feio, algo desconjuntado, velho, não combinava nem um pouco com criança. Eu me via sendo muito infeliz se eu fosse Tomás. Tomás da Cunha, então. Seria grande a quantidade de trocadilhos infames que eu teria que enfrentar tendo esse nome.
Essa coisa toda de nome é sempre uma complicação. Eu já custo muito a dar nome para meus livros, meus poemas, essas crônicas, os textos acadêmicos, fico imaginando o quanto seria difícil nomear um filho, se acaso eu me atrevesse a ter um. Porque se a gente parar para pensar, tudo só existe a partir da nomeação. De maneira geral, a palavra é aquilo que representa a coisa, não é necessariamente a coisa. Dessa forma, o nosso nome é a nossa palavra no mundo. É com ele que nos apresentamos, nos colocamos, somos lembrados, lembramos (não estou levando em conta aqui a força do sobrenome, isso é outra história, requer outra análise). O nome é uma responsabilidade muito grande e, pelas leis brasileiras, são os pais que atribuem os nomes aos filhos, mudá-lo é quase impossível, a menos que haja uma justificativa que envolva humilhação, embaraço, essas coisas. Se eu me chamasse Tomás, não haveria juiz brasileiro que mudaria meu nome. Como eu já disse, na infância me parecia um carga terrível, mas hoje até considero um nome forte, com o peso de toda a santidade de São Tomás de Aquino (segundo uma pesquisa rápida na internet, São Tomás de Aquino constava como santo no dia do meu aniversário, porque ele faleceu em 7 de março de 1274).
Olhando agora, percebo que o infortúnio de ter um nome conforme o calendário de santos poderia ser maior: eu poderia me chamar Tomás de Aquino da Cunha. Ou, meu pai e minha mãe, num lance poético musical resolver me chamar apenas de Aquino da Cunha. Pronto, tava feito mais um traumatizado no mundo. Claro, não tanto quanto aquele pobre personagem da piada o “Jacinto Aquino Rego”, que até onde sei é apenas um jogo com nomes e sobrenomes, mas diante das inúmeras listas com nomes estranhos que pululam por aí, é bem possível que haja na vida real um Jacinto Aquino. Atualmente, muitas crianças carregam nos nomes as letras K, Y, e W sem nenhuma economia, fora os “agás” no meio de qualquer sílaba. Enfim, tudo ainda passa pela cabeça dos pais que, muitas vezes, atribuem aos filhos os nomes que gostariam de ter.
A mim foi atribuído esse Rubens que combina bem com esse da Cunha. Outra coisa curiosa, Rubens nunca constou na folhinha, pois nenhum, até onde eu saiba, virou santo.

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